sexta-feira, 11 de julho de 2014

Sem pressão ninguém afunda

   Por toda a minha vida, eu sonhei em dormir uma noite sossegado, sem qualquer preocupação. Mas acontece que isso não passava de um sonho. Mesmo acordado, eu não conseguia pensar em outra coisa. Perdia o sono com isso. E, assim, eu continuava.
   Não era que eu pensasse nas coisas ou coisa do gênero, mas é que eu pensava em como seria em não tê-las na minha vida. O continente pelo conteúdo. Um caso simples de metonímia. Pensar em como seria não ter problemas sem, na verdade, enumerá-los.
   Colocar prioridades na minha vida, sempre foi um problema, mas isso se tornou ainda mais engraçado quando comecei a trabalhar. Acontece que eu fazia o meu trabalho relativamente bem, mas fazia o alheio ainda melhor. Por este motivo, acabei trocando funções no escritório.
   Secretamente, claro. Eu não era inteiramente competente para realizar tais funções. Algo que me surpreendeu. Até mesmo aos meus superiores. Algo sem precedentes, até então, quando muitos resolveram se mostrar. Parece que funcionávamos melhor sem pressão.
   Eu achava que funcionava bem sob pressão, até melhor do que o normal, até ver que era o meu traseiro na reta. Até eu ver que haveria consequências verdadeiramente desastrosas para o meu péssimo desempenho. E foi assim que eu comecei a ir mal.
   Eu tentava fazer o que eu achava que queriam que eu fizesse e acabava que eu não fazia o que sabia fazer melhor: meu próprio trabalho. E isso me sobrecarregou dia e noite, noite e dia. E eu não sabia exatamente o porquê disso tudo. Um trabalho ainda mais gratificante que o meu, impossível. Mas eu me encontraria sem ele se não encontrasse uma solução.
   E eu encontrei. Fazendo por meio de um favor, eu acabei fazendo o trabalho da mesa vizinha. E, assim, quando fiz o experimento, pedindo que ela fizesse o meu, percebemos o quanto a pressão nos prejudicava. Então, todos aderimos. Foi um movimento grande, mas silencioso. A chefia só percebeu depois de algum tempo, mas aí já era tarde demais.
   A discussão foi levada a uma reunião onde todos participamos de rostos sérios e apreensivos. A pauta só possuía um assunto. Deveríamos parar porque o regulamento da empresa não o permitiria fazer do jeito que queríamos. A discussão foi curta e grossa. Expomos nosso lado e, curiosamente, eles aceitaram nossos termos.
   Mas a burocracia demoraria muito tempo, de modo que continuamos a fazer o que queríamos na surdina. Acontece que a chefia sofria do mesmo. Era um problema cultural, praticamente. O trabalho que você faz, é seu, contanto que não tenha alguém para lhe vigiar porque, nesse caso, o trabalho será dessa pessoa.
   O sossego das noites está não em não ter problemas, mas sim em saber administra-los. O fato é cada questão tem sua prioridade e seu trabalho nunca estará em cheque contanto que você saiba fazê-lo melhor do que qualquer outro. Para isso, porém, você precisa fazer do seu jeito. E, se não tiver um, o primeiro passo é descobrir.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Distâncias imaginárias

Ele não tinha nome, mas ninguém tinha. Ninguém mais sabia de nada. O conhecimento humano já não era mais nada além de uma sombra. O menino não tinha idade. Não sabia os números. Sentava sozinho e era como ficava o dia todo, todos os dias.

Dormia de olhos abertos. Acordava sem perceber que havia dormido. E, nas olheiras, denunciava um sono muito maior do que o que sentia. Dentro de si, carregava mais lembranças do que gostaria de dizer. Mas não dizia nada. Tinha medo de fechar os olhos, de falar, do que poderia escapar.

Era levado, cada vez mais, ao Distante. Um mundo sem cor, transparente, bioluminescente. Lá, era assombrado por todo tipo de monstros. Em noites normais, ele podia se esconder nos livros, mas frequentemente ele era perseguido.

Minhas [des]ocupações mais valorosas...